terça-feira, 1 de maio de 2018

ESPECIAL | 'Estão acabando com os teatros no Brasil, isso é muito triste', diz o ator Flávio Migliaccio, aos 83 anos

👉Com exclusividade para Atores & Mídias*, a atriz Isa Di Morais entrevistou os atores Flávio Migliaccio e Luciano Paixão, nos bastidores da peça “Confissões de um Senhor de Idade“, no Rio de Janeiro. 
👉Migliaccio, que comemora 60 anos de carreira, fala sobre Deus, religião, do movimento #ProfissãoArtista e critica os governantes: “um País sem cultura e um ator sem um palco é um aluno sem escola“, desabafa. 
👉CONFIRA:

Flávio Migliaccio trava um bem-humorado diálogo com Deus (Luciano Paixão) em peça inspirada na Bíblia. (Foto: Érica Fonseca/Divulgação)
🎬 Por Isa Di Morais       
especial do Rio de Janeiro  
para Atores & Mídias

NO ÚLTIMO domingo (29/04), antes de pisar o palco do Centro Cultural Correios, no Rio de Janeiro, para a ultima apresentação da temporada da sua peça Confissões de um Senhor de Idade, o ator Flávio Migliaccio – ao lado de seu parceiro de cena, Luciano Paixão –, abriu as portas do seu camarim para a nossa equipe de Atores & Mídias.

Aos 83 anos, Migliaccio volta à cena, depois de mais de dez anos longe do teatro (a última peça foi “Os ratos do ano 2030”, de 1999). Em Confissões... ele assina o texto e a direção e atua, ao lado de Luciano Paixão (Deus).

No palco o ator vive um idoso ateu, que tem uma conversa com Deus. Todo o desenrolar da peça se passa em um sonho do protagonista, onde ele e a entidade discutem sobre a Bíblia e a origem da vida. Para ele, “Confissões...” é uma tragicomédia, capaz de provocar risos e lágrimas “e de fazer pensar”.
Nesta comédia em que comemora 60 anos de carreira, Migliaccio assina o texto e a direção e atua, ao lado de Luciano Paixão (Foto: Divulgação)
Flávio Migliaccio conta que estudou muito a Bíblia enquanto vinha escrevendo essa peça há uns dez anos. “É muito difícil escrever uma comédia sobre Deus, a partir de um livro sagrado. Fazer algo engraçado e que não seja desrespeitoso. Não desrespeito a religiosidade e a fé, mas sim o religioso impostor. E não deixo de criticar e satirizar uns absurdos da Bíblia, e a religião que se torna mercadoria, que chantageia as pessoas em troca de uma falsa promessa de vida eterna“

Com o espetáculo “Confissões...” o ator comemora 60 anos de carreira. Iniciou atuando em peças de teatro na periferia de São Paulo, onde logo descobriu a sua veia cômica. Começou sua carreira de ator profissional no Teatro de Arena em 1954. O seu primeiro papel foi o de um cadáver, na peça Julgue Você.

Flávio Migliaccio como seu Chalita,
ao lado de Andréa Beltrão e Fernanda Torres,
na série Tapas & Beijos, TV Globo.
 (Foto: Reprodução/Facebook)

Apaixonado pelo teatro foi na TV, no entanto, que o veterano ganhou projeção através dos quase 70 tipos que interpretou sempre marcados pelo bom humor. 

Flávio é muito conhecido pelo seu papel de Xerife na série de TV brasileira Shazan, Xerife e Cia., e pelo papel de Tio Maneco, na série exibida pela TVE

Na Rede Globo ele atuou nas novelas Rainha da Sucata, A Próxima Vítima, Vila Madalena, Senhora do Destino, Passione, dentre outras. Um de seus trabalhos recentes é o seriado Tapas & Beijos, como o querido seu Chalita, como ainda é chamado carinhosamente nas ruas pelos fãs.
Flávio Migliaccio e Luciano Paixão concederam entrevista exclusiva para a atriz Isa Di Morais, nossa Repórter Especial no RJ. (Foto: Reprodução)
Neste bate-papo, Migliaccio e Paixão falam sobre a polêmica da lei de extinção do registro de artista, e também sobre o futuro da profissão de ator. Confira:

Atores & Mídias – O STF (Supremo Tribunal Federal) diz que pode extinguir a existência do registro profissional de artista (DRT). Segundo a publicação, a decisão poderá “acabar com a obrigatoriedade de diploma ou certificado de capacitação das profissões de artistas e técnicos em espetáculos de diversões“. Qual a sua opinião sobre essa questão?

Flávio Migliaccio no camarim do teatro.
(Foto: Isa Di Morais)
Flávio Migliaccio – Eu sou meio suspeito pra falar, pois, quando eu comecei não existia registro profissional, diploma, essas coisas. Eu posso dizer, que se em 1954, quando eu comecei no Teatro amador... Existisse tal exigência, não teria começado. Então, como opinar? De acordo com a experiência que tenho não é só a regulamentação que faz o ator. 

O ator amador ele pode ter uma certa flexibilidade e exercitar a sua profissão se tornando um grande profissional, começando no teatro escola, clubes, igrejas na técnica, para sua própria experiência, e não querendo ir direto fazer a novela das 21h na TV Globo.

Hoje em dia, as pessoas que podem pagar um curso, uma faculdade, só eles tem direito a ser um artista? Por que condenar a camada mais humilde da população a viver eternamente ás voltas com uma enxada ou as agruras de um tanque cheio de roupas pra lavar?

Atores & Mídias – Como você vê o futuro “mercado de trabalho” dos atores diante do avanço da Mídia Digital, que, de uma certa forma tem influenciado muito na audiência da dramaturgia na TV?

Flávio Migliaccio – É inevitável que isso aconteça. Não se pode interromper o progresso. A atividade do ator terá que se adaptar a tudo que venha acontecer, e o ator ele está sempre preparado para inovar... Ou voltar às suas origens e participar, novamente, de festas populares e de espetáculos circenses... O que não é uma má ideia. Afinal, a Arte também tem a visão da camada mais humilde e carente da população, onde os próprios governantes se deixam a desejar, pois um País sem cultura e um ator sem um palco é um aluno sem escola. Estão acabando com os Teatros no Brasil, isso é muito triste.
“Essa lei é tão ridícula quanto inútil, só serviu para unir ainda mais a classe artística“, diz Luciano Paixão, sobre lei que quer acabar com o registro da profissão de artista. (Foto: Isa Di Morais)
LUCIANO PAIXÃO

Atores & Mídias – Qual a mensagem que você daria para os atores que sai do interior para realizar o sonho “ser artista” nas grandes metrópoles?

Luciano Paixão – 
A mensagem é de incentivo, claro. Embora nas grandes metrópoles, haja cada vez menos incentivo e apoio à arte, eu sempre penso que vale a pena perseguir um sonho! Mas embora os artistas do interior e recantos do Brasil, tenham uma cultura riquíssima e arte apurada, deve-se estar preparado para fazer outras coisas, trabalhar em outras frentes, talvez, enquanto sonhar. Nem sempre o sonho se realiza de cara. Mas vale a pena persegui-lo! E também sei que esse povo é guerreiro, batalhador e generoso! Não tem como não vencer! 

Atores & Mídias – O que você acha sobre essa decisão do STF (Supremo Tribunal Federal) pra extinguir a existência do DRT, e que ocasionou o movimento #profissão artista?

Luciano Paixão – 
Olha, é claro que se trata de uma represália ao artista, pelo fato de estar engajado nas lutas sociais e do povo. Mas é tão ridícula quanto inútil, essa lei. Realmente só serviu para unir ainda mais a classe e despertar o repúdio da população! Enfim, é um tiro que sai pela culatra e acerta o próprio pé de seu criador! 
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